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Entrevista | PONTO DE VISTA “Nova portaria cria aprovação quase automática e prejudica qualidade da educação”, alerta Bruno Vital, coordenador geral do SINTE-RN
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Sumário

O governo do Rio Grande do Norte editou a Portaria 6452, que permite que alunos da rede pública estadual avancem de série mesmo reprovando em até seis disciplinas no ensino médio. Na estreia da seção dominical de entrevistas, “PONTO DE VISTA”, o Portal de Notícias do SINTE Regional Mossoró entrevistou o professor Bruno Vital, coordenador geral do SINTE-RN, para discutir os impactos dessa medida controversa.

Bruno Vital classifica a portaria como um mecanismo de “aprovação quase automática” que compromete gravemente a qualidade da educação estadual. Segundo o coordenador geral da entidade, a medida cria um sistema educacional que não educa efetivamente, permitindo que estudantes avancem sem adquirir os conhecimentos necessários. Ele alerta que isso gerará descompromisso dos alunos com a aprendizagem e desvalorização do trabalho docente.

Leia a entrevista completa e compartilhe.

Professor Bruno Vital critica medida do governo estadual que permite progressão com reprovação em até seis disciplinas

O governo do Rio Grande do Norte editou recentemente a Portaria 6452, que altera o sistema de progressão e aprovação dos alunos da rede pública estadual. A medida permite que estudantes avancem de série mesmo reprovando em diversas disciplinas. Para discutir os impactos dessa decisão, o Portal de Notícias do SINTE Regional Mossoró entrevistou o professor Bruno Vital, coordenador geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do RN (SINTE-RN).

PNSRM Qual sua avaliação sobre a nova portaria que altera a progressão dos alunos da rede pública?

BRUNO VITAL No meu entendimento, a Portaria 6452, que cria esse regime de aprovação em progressão parcial, é uma portaria que vem para garantir que haja uma aprovação quase automática dos estudantes da rede. Isso vai criar um descompromisso do estudante com a aprendizagem. Não estou falando que a reprovação é algo desejado, muito pelo contrário, a gente deseja que todo estudante tenha condição de fazer suas provas e adquirir o conhecimento que precisa adquirir para poder avançar.

É importante que os estudantes aprendam, mas que eles de fato aprendam e não que uma aprovação seja feita ao final do ano, sendo que, na verdade, ele nem conseguiu adquirir aqueles conhecimentos e foi passado de ano tendo reprovado em seis disciplinas, que é o que está colocado para o ensino médio. A gente vai criar uma rede que não educa, que não faz o aluno aprender, que aprova esse aluno, que passa ele para a série seguinte sem ele ter adquirido aquilo que ele precisava adquirir.

PSRM Qual o impacto dessa medida para a qualidade da educação?

BRUNO VITAL A gente vai ter uma queda na nossa qualidade. Ainda que a gente tenha uma indicação de números de aprovação mais altos, que vão parecer para a sociedade, às vezes, que a rede está melhor porque ela aprovou mais os estudantes, na verdade, a gente não vai ter aprendizagem condizente com essa aprovação.

Então eu entendo que essa portaria retrocede a nossa educação estadual, faz com que os estudantes estejam perdendo conteúdo, perdendo compromisso com a educação e a gente tenha uma rede mais fragilizada, uma falsa aprovação, um falso sucesso escolar, quando, na verdade, a gente não tem aprendizagem real. É uma medida que retrocede e que traz prejuízo para a nossa rede estadual.

PSRM Essa metodologia já foi adotada há quase 30 anos. Por que considera um retrocesso retomar essa prática?

BRUNO VITAL Nós temos progressões que vêm acontecendo já na rede e nós sabemos que não acontecem a contento, pela falta de reposição desse conteúdo na prática no ano seguinte. O estudante, por exemplo, do nono ano do ensino fundamental, pode hoje já ficar em três disciplinas e ser aprovado em regime de progressão.

O que a gente tem, na verdade, é esse estudante não tendo essa reposição acontecendo. Porque o ideal era que ele pudesse avançar e que ele pudesse, de fato, estudar, cursar a disciplina novamente e fazer as avaliações para poder, de fato, ser aprovado. Na prática, isso não acontece porque esse estudante não chega no contraturno na escola, por exemplo, para cursar essa disciplina, não retorna para a escola anterior.

PSRM Qual seria a alternativa para garantir a aprendizagem?

BRUNO VITAL O que o Estado precisaria fazer era garantir que aquele estudante, já no início do ano, quando está com prejuízo de aprendizagem, já nos primeiros bimestres, esse aluno fosse observado e pudesse ter um reforço escolar, de forma que ele pudesse atingir aquele conhecimento que ele não conseguiu até ali, dentro do próprio ano letivo.

Por exemplo, o aluno é do nono ano do ensino fundamental e está com dificuldade em matemática – no primeiro bimestre ele tirou uma nota baixa. Se houvesse um compromisso com essa aprendizagem, a partir daí já esse estudante teria um reforço para que ele pudesse chegar ao final do ano, no quarto bimestre, com suas notas recuperadas, com o conhecimento adquirido. Isso seria, de fato, compromisso com a aprendizagem.

PSRM Essa medida será adotada apenas na rede pública. Isso criará disparidades com a rede privada?

BRUNO VITAL Com certeza. Hoje, na prática, os estudantes da rede privada que têm dificuldade, como seus pais também têm recursos, eles geralmente contratam professores particulares, colocam o aluno no reforço. É por isso que eles conseguem progredir, que eles conseguem passar de ano, exatamente porque têm o reforço para poder avançar.

O estudante da rede pública já não tem isso. Temos diversos cenários no estado – o estudante que mora no interior, por exemplo, não tem como estar os dois turnos na escola, o estado não garante um ônibus para ele estar no contraturno.

O ideal era que a rede construísse uma rede de apoio para esses estudantes, com outros profissionais, com outros professores, ou ampliando a carga horária dos nossos professores para eles ficarem no contraturno trabalhando, dando reforço escolar. Aí sim a gente teria a equiparação entre as redes.

Já temos disparidades hoje e a medida vai aprofundar a desigualdade entre a rede privada e a rede pública, oficializando essa defasagem como se ela fosse correta, por essa metodologia de aprovação que o Estado vai criar.

PSRM E qual o impacto dessa medida na vida do educador?

BRUNO VITAL A gente tem escutado relatos dos professores de muito desagrado com a medida, exatamente porque ela cria a ideia de que não é importante o trabalho que o professor realiza, já que o estudante não precisa passar na disciplina. Vai criar, sim, na rede esse sentimento de desvalorização do trabalho docente.

Essa prática vai fazer com que esses estudantes passem de ano sem terem aprendido, sem terem nem compromisso com a aprendizagem deles mesmos, porque eles sabem que podem reprovar e mesmo assim vão passar de ano.