Sob a relatoria de Cristiano Zanin, voto que propõe prazo de 24 meses para adaptação de planos de carreira é criticado por entidades sindicais, que veem na medida um retrocesso histórico e insegurança jurídica.
Por Ibero Hipólito
O julgamento do Tema 1.218 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), decisivo para a estabilidade financeira e jurídica do magistério público brasileiro, sofreu uma nova interrupção. O ministro Dias Toffoli pediu vista (mais tempo para análise) no último dia 12, suspendendo a votação que define se o reajuste do Piso Salarial Nacional deve incidir automaticamente sobre todos os níveis dos planos de carreira dos professores ou apenas sobre o vencimento inicial.
A suspensão, embora prevista no rito processual, deflagrou críticas contundentes por parte de lideranças sindicais. Em vídeo divulgado à categoria, Fátima Cardoso, coordenadora geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Rio Grande do Norte (SINTE/RN), expôs não apenas a frustração com o adiamento, mas uma preocupação técnica e política com o voto já proferido pelo relator, ministro Cristiano Zanin.
O “Meio-Termo” de Zanin e a Crítica Sindical
O ponto nevrálgico da controvérsia reside na tese apresentada por Zanin. Embora reconheça a constitucionalidade do piso, o ministro propôs um prazo de 24 meses para que estados e municípios “criem” ou adaptem seus planos de carreira.
Para o SINTE/RN, essa modulação temporal soa como uma incoerência jurídica. “Zanin pediu 24 meses para se criar os planos de carreira, quando a gente vem desde a década de 2000 com a obrigação de ter planos de carreira nos estados e municípios”, disparou Cardoso.
A crítica de dirigentes sindicais aponta aqui uma contradição flagrante entre o voto do relator e a legislação vigente. “A Lei do Piso (Lei 11.738) foi sancionada em 2008. Ao conceder, em tese, mais dois anos para adequação, o Judiciário pode estar, na prática, concedendo uma “anistia” administrativa a governadores e prefeitos que descumpriram a legislação federal por mais de 15 anos”, alertou o professor Rômulo Arnaud, também coordenador geral do SINTE RN.
Insegurança Jurídica e Silêncios do Voto
A análise da dirigente sindical revela outro ponto de tensão: a ambiguidade. Segundo Cardoso, o voto de Zanin “não deixa claro se quem já tem os planos de carreira terá a incidência do piso imediatamente”.
Essa lacuna no voto do relator cria um vácuo interpretativo perigoso. Se o texto final não for explícito, abre-se margem para que Executivos estaduais e municipais congelem progressões verticais e horizontais sob a justificativa de estarem no “período de adaptação” de 24 meses, mesmo em locais onde a legislação local já prevê o escalonamento, como no Rio Grande do Norte.
O Contexto Político: Quem ganha e quem perde
O pedido de vista de Dias Toffoli impõe um freio de arrumação. Pelo Regimento Interno do STF, o ministro tem até 90 dias para devolver o processo. Na prática, isso empurra a decisão final para o calendário de 2026, ano eleitoral, o que adiciona uma camada de complexidade política ao julgamento.
- Quem ganha com o adiamento e o voto de Zanin: Os cofres estaduais e municipais. A Confederação Nacional de Municípios (CNM) e governadores pressionam o STF argumentando impacto fiscal insustentável caso o “efeito cascata” (repercussão na carreira) seja mantido integralmente.
- Quem perde: A categoria dos professores e professoras, que vê o poder de compra achatado. A desvinculação do piso da carreira tende a transformar o salário inicial em teto, achatando a remuneração de profissionais com doutorado e décadas de serviço ao nível de recém-contratados.
Mobilização e Próximos Passos
Diante do cenário adverso no Judiciário, a estratégia sindical retorna à pressão política de base. Fátima Cardoso anunciou que o tema será central no congresso da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) em janeiro, e que a cobrança pelo cumprimento da lei continuará nas redes estadual e municipais (com ênfase em Natal) no ano letivo de 2026.
“Vamos aguardar, mas com sentimento de luta”, finalizou a dirigente, sinalizando que a categoria não aceitará passivamente uma decisão judicial que desidrate o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração (PCCR).